Como desenvolver o pensamento crítico em tempos de inteligência artificial? Conheça estratégias pedagógicas para integrar a IA de forma ética e significativa na educação básica
Este texto foi produzido pela Professora Débora Garofallo, publicado no site da PORVIR: Como desenvolver o pensamento crítico em tempos de IA?
Vivemos uma era marcada pela velocidade da informação e pela crescente presença da inteligência artificial em todos os aspectos da vida, inclusive na educação. Plataformas como ChatGPT, ferramentas de busca avançadas e assistentes de escrita têm se tornado frequentes no cotidiano de estudantes e professores. Se, por um lado, essas tecnologias oferecem apoio e agilidade, por outro, impõem um desafio urgente: como cultivar o pensamento crítico em um contexto de respostas automáticas e prontas?
Dados da pesquisa TIC Educação 2023 (que entrevista a comunidade escolar para mapear o acesso, o uso e a apropriação das tecnologias de informação e comunicação) mostram que 91% dos professores do ensino fundamental e médio já utilizam alguma forma de tecnologia digital em suas práticas pedagógicas. No entanto, segundo o relatório Education at a Glance 2022, da OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico), apenas 45% dos professores sentem-se preparados para ensinar habilidades relacionadas à análise crítica de informações, um dos pilares da formação cidadã.
O acesso rápido a conteúdos prontos pode levar os estudantes a uma postura passiva diante do conhecimento, limitando-se ao consumo superficial da informação. Em vez de perguntar, investigar e refletir, tornam-se apenas reprodutores de respostas. Isso é preocupante, especialmente quando pensamos em uma educação comprometida com a autonomia intelectual, a formação ética e o engajamento social.
A BNCC (Base Nacional Comum Curricular) já aponta o pensamento crítico como uma das 10 competências gerais da educação básica. Isso reforça a importância de estratégias intencionais por parte do professor para que essa habilidade seja desenvolvida de forma sistemática e significativa. A IA, nesse contexto, pode ser tanto uma aliada quanto uma distração; tudo depende da mediação pedagógica.
Análise comparativa de fontes: proponha que os estudantes consultem diferentes respostas geradas por ferramentas de IA e analisem as variações, lacunas e possíveis vieses. Incentive que verifiquem fontes e identifiquem se há argumentos consistentes. Dê uma mesma pergunta a três plataformas e peça que a turma avalie qual delas traz uma resposta mais fundamentada.
Criação de perguntas, não só respostas: estimule os estudantes a elaborarem boas perguntas antes de buscar soluções. Saber perguntar é o primeiro passo para pensar criticamente. Uma dinâmica possível envolveria criar um mural com perguntas que surgissem a partir de um tema atual e escolher algumas para serem investigadas em grupo.
Debates mediados com base em evidências: trabalhe temas controversos com diferentes pontos de vista. A turma pode utilizar ferramentas de IA para levantar dados, mas precisam argumentar com base em fontes confiáveis e desenvolver contra-argumentos. Essa prática favorece a escuta ativa, a argumentação e o respeito às divergências.
Reflexões éticas sobre o uso da IA: traga discussões sobre os limites e implicações do uso dessas tecnologias: O que é plágio? Como garantir autoria? Quem programa os algoritmos? Proponha a criação de um código de ética para o uso de IA na escola, elaborado pelos próprios estudantes.
Escrita autoral com apoio, não substituição: utilize a IA como uma ferramenta para auxiliar na revisão textual ou ampliação de repertório, mas nunca como substituta da produção do estudante. Uma atividade interessante é comparar um texto autoral com um gerado por IA e identificar os elementos de originalidade, criatividade e profundidade presentes em cada um.
A presença da IA nas escolas exige mais do que apenas domínio técnico. O professor deve ser um curador de informações e um mediador de aprendizagens significativas. Cabe a ele estimular a curiosidade, provocar reflexões, instigar a dúvida e valorizar o processo, e não apenas o resultado. O pensamento crítico se desenvolve na experiência, no conflito de ideias, na investigação contínua e no incentivo à autonomia.
Em tempos de respostas imediatas, educar para o pensamento crítico é mais urgente do que nunca. A inteligência artificial pode e deve ser integrada às práticas pedagógicas, mas sempre com intencionalidade, responsabilidade e foco no desenvolvimento humano. Ensinar os estudantes a pensar, questionar e refletir é a verdadeira inovação da nossa era.